Janela um: Uma grande avenida de uma cidade feia. Milhões de árvores arrancadas no canteiro central. Sobram troncos. Um senhor que coloca uma cruz de madeira, feita por ele mesmo, em cada tronco – ou cada resto de árvore. Ele jamais foi à Igreja e também não sabe quem é Deus. Entende de madeira. Coisas feito dela.
Janela dois: Uma praça que dizem causar liberdade nos outros. Uma senhora gorda leva seu passarinho para passear. O passarinho dentro da gaiola, amarelinho, cor de vida inventada. A senhora carrega a gaiola para todos os cantos da praça, conversa com o bichinho, silencia, coloca-o próximo das árvores. Caminha até o chafariz, posiciona a gaiola de acordo com o lado em que a água atinge. O passarinho nada.
Janela três: Um homem sozinho que escreve letras de música. Nunca tocou um instrumento e também não conhece muitas canções. Nas letras que escreve têm um pouco de saudade, de abandono, de desejo, de sonhos, sonhos, sonhos. Ama uma mulher que não cabe em melodias. O homem cantarola em silêncio lamentos de um amor não vivido.
Janela quatro: Um senhor que gosta de ficar na porta do teatro escutando rádio. Jamais foi ao teatro e também não tem muita curiosidade, prefere mesmo é acompanhar a pressa das pessoas que entram e saem dali. Gosta de relacionar cada pessoa à alguma canção que escuta no rádio (mas isso ele não conta pra ninguém). Já foi convidado para vários espetáculos, nunca quis. Diz que tem taquicardia e não suporta locais fechados.